Como um novo medicamento é desenvolvido e testado?

Essa é uma pergunta que muitos de nós, pacientes ou familiares de pessoas com doenças raras em especial, nos fazemos constantemente. Frequentemente nos deparamos com notícias sobre pesquisa ou lançamento de novas terapias, mas não entendemos o processo existente entre o desenvolvimento de um novo medicamento até a chegada dele para o paciente.

O intuito deste texto não é falar sobre os inúmeros problemas existentes neste processo (ou inclusive na distribuição dos medicamentos que já estão disponíveis no SUS), e também não tem como propósito falar das “injustiças” existentes, as demoras, burocracias, entre outros. O foco é informar para que todos possam entender melhor como o processo de desenvolvimento acontece, até a chegada do medicamento para o paciente.

Inicialmente, precisamos saber que todo medicamento que vai ser lançado no mercado passa por diversas etapas de pesquisa e testes até ser aprovado pelo órgão competente do país de origem do fabricante. Na hipótese do medicamento ser produzido em outro país, por exemplo, ao chegar no Brasil ele precisa ser aprovado e registrado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A primeira etapa necessária para que um medicamento exista, é a sua descoberta. Em média, leva-se de 10 à 12 anos entre o momento da descoberta, a fase de pesquisa e desenvolvimento inicial, o desenvolvimento clínico até chegar na comercialização. Nem todas as descobertas tornam-se medicamentos. Há milhares de pesquisas em andamento no mundo, e inúmeros pesquisadores sem incentivo para desenvolverem sua pesquisa, além de outras variáveis que impossibilitam que uma molécula seja comercializada como medicamento.

O processo de regulamentação de um medicamento é longo, rigoroso e custa muito caro para a indústria farmacêutica. Ele deve cumprir diversas etapas, desde as que antecedem seu uso por seres humanos até o acompanhamento após o lançamento do medicamento, que comprovem que aquele produto não trará reações prejudiciais à vida das pessoas.

A partir da descoberta e desenvolvimento, inicia-se a pesquisa pré-clínica e a pesquisa clínica, sendo que esta última é composta por 4 fases:

Pesquisa Pré-clínica:

Esta etapa tem o objetivo de verificar se a substância candidata a fármaco é eficaz e segura, além de analisar como a nova substância é absorvida pelo corpo, como é eliminada e sua segurança. Geralmente o estudo pré-clínico é realizado primeiramente in vitro (ensaios laboratoriais sem o uso de animais) e posteriormente in vivo (ensaios laboratoriais que utilizam animais); trata-se da etapa mais importante nesta fase, pois avalia a atividade do fármaco em um ser vivo. Para tanto, são estudados em vários modelos animais (em diversas espécies, como camundongo, rato, cobaia, coelho). De 1.000 substâncias testadas em animais, aproximadamente 10 são aprovadas para continuar em desenvolvimento, seguindo para a Fase I da pesquisa clínica.

E o que é uma pesquisa clínica?

Depois da etapa com animais, os estudos clínicos são pesquisas científicas que envolvem seres humanos e têm como objetivo avaliar a segurança e eficácia de um procedimento ou medicamento em teste por meio da coleta de dados (exames, procedimentos, coleta de sangue e outros materiais biológicos, entrevistas etc).

É o estudo sistemático que segue métodos científicos aplicáveis aos seres humanos, denominados voluntários da pesquisa, sadios ou enfermos, de acordo com a fase da pesquisa.

Todas as pesquisas envolvendo seres humanos e animais devem ser submetidas à apreciação de um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP). Além disso, toda a participação em pesquisa é voluntária e o processo de aplicação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) possibilita ao participante o acesso a informações relevantes à decisão em participar, como por exemplo, justificativa e objetivos do estudo, possíveis desconfortos, riscos e benefícios esperados, métodos alternativos existentes e procedimentos que serão realizados durante a pesquisa.

E quais são as fases de uma pesquisa clínica?

Fase 1: Primeira investigação sobre o potencial de um novo medicamento em seres humanos, para determinar como o medicamento reage no organismo e vice-versa (absorção, distribuição, metabolização). Geralmente conduzido em pequeno número de voluntários saudáveis com o objetivo principal de avaliar primeiramente a segurança e a dosagem ideal do produto sob investigação.

Fase 2: Foca na efetividade clínica do medicamento, e é realizado em pacientes com a doença. O estudo também avalia efeitos adversos de curto prazo e riscos relacionados à segurança do medicamento, como, por exemplo, a incidência de reações adversas. Geralmente é feita em um número maior de sujeitos de pesquisa.

Fase 3: Estudos realizados em grande número de pacientes, comparando o medicamento com o melhor tratamento existente ou padrão de tratamento da doença. Seu objetivo é confirmar os dados de segurança e eficácia obtidos na fase 2, determinar as reações adversas mais frequentes e a relação risco/benefício no curto e longo prazos do produto. Se os resultados forem favoráveis, estes estudos são utilizados para solicitar o registro do medicamento.

Registro: Para que este produto chegue ao mercado, ele deverá ser registrado de acordo com a legislação sanitária vigente. Para esse processo, o fabricante deverá apresentar à agência reguladora (a Anvisa) os resultados de todas as fases pré-clinicas e estudos clínicos junto com a descrição dos processos de produção do medicamento. Se a Anvisa estiver de acordo com os dados submetidos referentes a qualidade, eficácia e segurança do medicamento, a autorização para lançamento e comercialização é concedida, e o novo medicamento estará disponível aos pacientes.

  • Falando especificamente da Fibrose Cística, no momento há dois medicamentos nesta etapa de Registro junto à Anvisa. Ambos já foram desenvolvidos, testados e registrados no país de origem e agora estão buscando registro junto à Anvisa, para que então possam seguir para as próximas etapas de comercialização e distribuição no Brasil.

Fase 4 – Pesquisa pós-comercialização – Farmacovigilância: Estudos de pós comercialização, são conduzidos após a aprovação do medicamento pelas autoridades regulatórias e podem incluir milhares de pacientes. Estes estudos são geralmente desenhados para avaliar a eficácia e segurança do medicamento em longo prazo e para testa-lo no “mundo real” da prática clínica. Visa também detectar eventos adversos pouco frequentes ou não esperados, explorar novas indicações, métodos de administração ou combinações.

E onde posso acompanhar as pesquisas de novos medicamentos para Fibrose Cística?

O portal Drug Development Pipeline (Canal de Desenvolvimento de Drogas) da Cystic Fibrosis Foundation (Fundação de Fibrose Cística dos Estados Unidos, que investe no desenvolvimento de novos medicamentos) permite rastrear e acompanhar o progresso do desenvolvimento dessas novas potenciais terapias. Você pode acompanhar por aqui: https://www.cff.org/Trials/pipeline

Recentemente publicamos um texto no nosso site falando sobre este acompanhamento, e você pode acessá-lo novamente por aqui: http://unidospelavida.org.br/onde-posso-acompanhar-o-desenvolvimento-das-novas-drogas-para-fibrose-cistica/

Nos próximos textos falaremos sobre como um medicamento já aprovado pode ser disponibilizado para os pacientes pelo SUS.

Até lá!

Por:

  • Verônica Stasiak Bednarczuk, diretora fundadora do Unidos pela Vida, paciente com Fibrose Cística, psicóloga, especialista em Análise do Comportamento, membro do Grupo Brasileiro de Estudos de Fibrose Cística, pós graduanda em Micropolítica e Gestão do Trabalho no SUS pela Universidade Federal Fluminense.

Revisão:

  • Dr. Vinícius Bednarczuk de Oliveira, farmacêutico, pós-doutorando em Ciências Farmacêuticas pela Universidade Federal do Paraná, professor universitário e colunista científico do portal do Unidos pela Vida.

Nota importante: As informações aqui contidas tem cunho estritamente educacional. Em hipótese alguma pretendem substituir a consulta médica, a realização de exames e ou, o tratamento médico. Em caso de dúvidas fale com seu médico, ele poderá esclarecer todas as suas perguntas.

Fonte:

  • Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária – www.anvisa.gov.br
  • Cystic Fibrosis Foundation – www.cff.org
  • Drug Development Pipeline – Cystic Fibrosis – https://www.cff.org/Trials/pipeline
  • Fundação CECIERJ: http://cecierj.edu.br
  • Oficina Colabore com o Futuro – Colaborando com as Políticas Públicas do Brasil – www.colaborecomofuturo.com
  • Oficina Sense & Roche para Associações de Pacientes de Fibrose Cística – II Encontro Nacional de Desenvolvimento de Associações de Fibrose Cística – https://www.wearesense.company/

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Source: Unidos pela Vida